Nos momentos mais críticos da pandemia, várias empresas do setor de comércio exterior começaram a repensar a logística internacional. Vale a pena concentrar tudo em um único país? E se houver outras questões sanitárias ou conflitos geopolíticos, como vem acontecendo com a guerra na Ucrânia, teremos problemas similares aos enfrentados nos últimos anos, como aumento de fretes, falta de insumos e espaços nos navios para cargas conteinerizadas?
Esses questionamentos reacenderam algumas discussões sobre conceitos muito utilizados na área de tecnologia, mas que passaram a ser vistos como possíveis tendências para 2023: reshoring e nearshoring. O primeiro deles consiste no retorno de atividades industriais para o país de origem como forma de reduzir taxas de fretes e problemas relacionados ao fuso horário, cultura e falta de flexibilidade de alguns fornecedores. Já o nearshoring consiste na terceirização de serviços em países estrangeiros com características similares ao país de origem. Assim, um centro de delivery instalado no México pode atender perfeitamente as demandas de outros países latino-americanos e dos Estados Unidos, da mesma forma que uma estrutura na Romênia pode ser o hub para a Europa Ocidental.
Tanto o nearshoring quanto o reshoring trazem grandes vantagens como fusos horários próximos, proximidade geográfica, mão de obra sólida, sustentabilidade e crescimento das empresas e da economia.
Particularmente, vejo o reshoring mais voltado para os Estados Unidos, onde a indústria trabalha com produtos de alto valor agregado. Algumas multinacionais de tecnologia, por exemplo, têm optado por deixar a China para regressar aos EUA. Segundo levantamento realizado no ano passado pela Bloomberg em apresentações de resultados corporativos e transcrições de conferências de executivos com analistas de mercado, foram quase 200 menções aos termos reshoring, nearshoring e onshoring. Já dados do Dodge Construction Network apontam para um incremento, em 2021, de 116% na construção de novas instalações fabris nos Estados Unidos.
Para os demais países, acredito que o nearshoring – processo de realocação da operação de uma empresa para um país mais próximo – tem encontrado mais aderência no setor de Comex e pode ser visto como uma forte tendência para este ano, além de ser uma grande oportunidade para a Índia, México e Sudeste Asiático. O Brasil também pode vir a ser um candidato a hub regional, desde que promova mudanças em infraestrutura, tributação e redução da burocracia.
Segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), o Brasil pode ter um ganho adicional de US$ 7,8 bilhões ao ano nas exportações com a reconfiguração do comércio internacional.
Tanto no reshoring quanto no nearshoring, a tecnologia será uma aliada essencial para transformar grandes volumes de dados em insights que poderão beneficiar as operações logísticas, tornando os processos mais ágeis, fluidos e eficientes de ponta a ponta.
Atualmente, o maior problema na cadeia de suprimentos é a falta de visibilidade de todas as informações. Por exemplo, se a carga vem da China para a América do Sul e, por alguma razão, ocorre um transbordo, que é uma parada técnica do armador, essa carga geralmente acaba mudando de navio. Como esse novo navio não estava previsto na plataforma do armador, a situação pode comprometer o planejamento.
Com a inteligência de dados, potencializada pelas soluções de Inteligência Artificial, é possível minimizar os impactos na cadeia logística, não importa se o modelo adotado é reshoring ou nearshoring. A integração das informações otimiza tempo, reduz custos e garante mais transparência e vantagem competitiva para as empresas do setor.
(*) Rafael Dantas é Diretor de Vendas da Asia Shipping, um dos maiores integradores digitais da América Latina.